O que as freiras de Notre Dame têm a nos ensinar sobre como proteger o nosso cérebro?

As melhores pistas sobre como prevenir a doença de Alzheimer e proteger seu cérebro de outras doenças relacionadas à demência são provenientes de um estudo histórico com mais de 30 anos.

Então, o que você faz quando quer identificar os fatores de risco sobre “a triste arte de esquecer as coisas”? É relativamente fácil: você encontra um grande número de pessoas, divide em dois grupos, determina qual delas tem a queixa e qual não sucumbiu à doença, depois analisa o que os dois grupos fizeram de forma diferente. Com exceção dos resultados mais precisos, todas essas pessoas precisam viver exatamente o mesmo estilo de vida, comido exatamente o mesmo alimento e ter, aproximadamente, a mesma quantidade de sono por décadas.

Mas, vamos pensar um pouco: onde se encontra um grupo de pessoas com essas características? Não é tão fácil, por assim dizer, a menos que você tenha acesso a centenas e centenas de freiras. Sim, freiras!

E foi exatamente isso que o Dr. David Snowdon fez. David A. Snowdon, nascido em 1952, é um epidemiologista e professor de neurologia no Sanders-Brown Center on Aging da Universidade de Kentucky. Os seus interesses de pesquisa incluem antioxidantes, envelhecimento e a neuropatologia da doença de Alzheimer, especialmente os fatores preditivos no início da vida e o papel do infarto cerebral.

Ele é o diretor do “Estudo das Freiras”, um estudo longitudinal do envelhecimento e da doença de Alzheimer, que acompanha 678 membros das Irmãs Escolares de Notre Dame com mais de 75 anos de idade. Este estudo longitudinal do envelhecimento e da doença de Alzheimer foi iniciado em 1986, por Snowdon. O pesquisador recrutou a ajuda de 678 freiras católicas, que lhe deram todos os registros médicos e concordaram em doar seus cérebros depois da morte para estudo posterior.

O que fez esse grupo de participantes do estudo tão especial foi a similaridade particular com a qual elas tinham liderado suas vidas – nenhuma delas fumava, nenhuma bebia excessivamente, nenhuma  tinha parceiros e cada uma vivia uma vida bastante rotineira e significativa.

No mundo da ciência, ter tantos participantes com aproximadamente as mesmas variáveis de controle é uma verdadeira dádiva de Deus e quase impossível de replicar.

AS EVIDÊNCIAS

O “Estudo das Freiras” ainda está em andamento, mas o que Snowdon e sua equipe descobriram até agora é notável. Mais intrigantemente, as autópsias nos cérebros de várias freiras mostraram que elas tinham todos os sinais físicos da doença de Alzheimer – mas, quando vivas, não apresentaram nenhum tipo de sintoma e permaneceram mentalmente afiadas na velhice.

A conclusão preliminar parece demonstrar que as pessoas que leram, escreveram e se estimularam intelectualmente ao longo dos seus vinte e poucos anos têm uma melhor chance de evitar a demência mais tarde na vida.

Os pesquisadores especulam que foi o raciocínio mental desenvolvido no início da vigília das freiras que ajudou a reduzir o efeito total do encolhimento cerebral na velhice – uma “almofada” do pensamento.

AS LIÇÕES

Então, o que os cérebros das freiras podem ensinar ao resto de nós sobre evitar a demência à medida que envelhecemos? Snowdon diz que as lições aprendidas com suas pesquisas são interessantes, mas certamente não são 100% comprovadas. Embora as freiras representem um grupo interessante (e raro) de participantes, você não pode fazer suposições variadas com base em um único estudo.

Dito isto, ele acredita que os danos físicos ao cérebro – seja por acidente vascular cerebral ou concussão – provavelmente acelerarão a taxa em que a doença de Alzheimer se desenvolve. Os comportamentos causadores de acidentes vasculares cerebrais, como a falta de exercício, o tabagismo e a má alimentação, também podem desempenhar um papel preponderante.

Snowdon descobriu também que, durante os exames cerebrais, as freiras que apresentavam níveis elevados de folato (o folato é a forma biodisponível natural de vitamina B9 encontrada numa variedade de alimentos de origem vegetal e animal) também tiveram menos chances de ter as cicatrizes físicas da doença de Alzheimer nos cérebros. O folato (às vezes referido como ácido fólico) é uma vitamina do grupo B natural que se encontra concentrada em vegetais verdes escuros como espinafre e brócolis.

Quando você consome alimentos com alto teor de ácido fólico, seu corpo se torna mais eficiente na produção dos fios de DNA que ajudam a proteger o cérebro, o sistema nervoso central e até mesmo sua saúde emocional. Os médicos regularmente perguntam às mulheres grávidas para se certificarem de que estão consumindo níveis adequados de folato, já que se provou que o folato reduz o risco de falhas no tubo neural em bebês.

Por último, mas não menos importante, a lição mais surpreendente do estudo de freiras em curso foi que as irmãs que tinham uma maior “densidade de ideias” – ou seja, usavam seus cérebros várias vezes por dia para ler, escrever, pensar e examinar – eram candidatas menos prováveis (embora isso não seja garantido) para sucumbir à doença de Alzheimer.

No total, graças às irmãs extremamente generosas de Notre Dame, parece que estamos começando a destruir as “bordas” do que poderia causar os distúrbios relacionados à demência, como a doença de Alzheimer.

Flávia Valadares – Neurocientista e Psicopedagoga da Escola PraticaMente

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